MARIA HELENA POR ANÍBAL NOBRE




Irmão que vives para além do mar
afastado de mim por tantos nós;
que tens na alma a alma do luar
e nas veias o sangue do cipós;
irmão que segues de olhos deslumbrados
e não vês rosas sem poder colhê-las,
e trazes nos cabelos desmanchados
a carícia noturna das estrêlas;
tu, que tens os sentidos bem despertos
e uma chama a pulsar no coração
e enches todo o silêncio dos desertos
com o grito escaldante do sertão;
tu, que te levas por caminhos sábios
e que não andas pelo mundo à-tôa,
e mataste a secura dos teus lábios
beijando os lábios frescos da garoa;
tu, que não te naufragas em cansaços
nem receias surprêsas na viagem
e tens no ritmo aéreo dos teus passos
a musical cadência da folhagem;
tu, que sonhas à margem dos escombros
e dos loucos vasios de ideal
e que apenas suportas nos teus ombros
o pêso da loucura tropical,
irmão: se mesmo quando a dor te assiste
abres na bôca o riso de uma aurora,
já que eu só sei chorar quando estou triste
vem-me ensinar a rir quando se chora!

Maria Helena
(Lisboa, Portugal, 1906-1998,
do livro Concêrto a quatro mãos - Poesia, Rio de Janeiro, 1959,
de J. G. de Araujo Jorge e Maria Helena)




MARIA HELENA é o nome da Genial Poetisa Maria Helena Vaquinhas de Carvalho, que também usou, durante um determinado período de sua Vida, o nome de Maria Helena Duarte de Almeida. Nascida em Lisboa no dia 29 de Março de 1906, veio a falecer em Julho de 1998 na capital, cujo funeral teve a minha presença e a do Grande Poeta e nosso comum Amigo João Baptista Coelho.

Maria Helena, a quem me ligou uma grande e muito antiga Amizade, é unanimemente considerada como um dos valores de sempre da Poesia portuguesa. Tendo começado a versejar aos 4 anos de idade, nunca mais deixou de o fazer. Embora muito conhecida e admirada entre nós, é no Brasil que Maria Helena vê mais justamente reconhecido o seu real Valor, sendo membro de 5 Academias de Letras e tendo lá publicado 5 ou 6 livros. Possuo quase toda a sua Obra, com lisonjeiras dedicatórias em verso. O livro "Tempo de ser quase Manhã" foi-me oferecido, com uma dedicatória extraordinária em verso, cerca de um mês antes de ter rumado ao Céu.

Uma dezena de outros livros ficaram por publicar, ainda que prontos para tal, especialmente em Poesia. Maria Helena produziu até dias antes de nos deixar! Senhora de tão sólida Cultura; de tão invulgar Talento; de tão invejável riqueza de vocabulário e de imagens poéticas; de tão inesgotável inspiração... que a genialidade que lhe atribuo não passa de uma constatação mais que evidente!

Habitual concorrente de Jogos Florais e outros Concursos Literários, quer em Portugal e Brasil, quer em diversos outros países, nomeadamente em Itália, onde viveu vários anos, Maria Helena, à data de sua morte, tinha conquistado 1.220 prêmios, em todas as modalidades conhecidas de Poesia e Prosa, facto que fazia dela um dos mais distinguidos Autores portugueses. Isto, com base nos últimos dados que me forneceu, em 1997, aquando da formação da Academia Antero Nobre de Artes e Letras, de que era Membro Fundador. No 1º Concurso Literário desta Academia, em 06 de dezembro de 1998, Maria Helena foi alvo de uma justíssima e comovente homenagem, em conjunto com a que foi prestada a meu pai, Antero Nobre, Patrono da Academia.

Mas o talento de Maria Helena não se esgotava na Poesia. Era também - e com assinalável destaque! - conferencista, dramaturga, contista, historiadora, música, ceramista e declamadora excepcional. Além disso, falava e escrevia em diversas Línguas e era uma extraordinária conversadora. Também sabia um pouco de Esperanto.

Ao longo de muitas décadas de Amizade, Maria Helena dedicou-me dezenas e dezenas de poesias, que carinhosamente guardo. Também me prefaciou um livro e convidou-me para lhe prefaciar o seu próximo... o que não chegou a acontecer por Deus a ter chamado inesperadamente. Deste seu livro, que até já tinha título, também já eu iniciara a composição e fizera a capa, a seu pedido. Cognominada, no meio em que nos movemos, por "A Montanha", numa clara alusão ao tamanho do seu Talento (e fui eu o autor desse epíteto!), teve também, como todos os que se atrevem a ter Valor, alguns detratores em cujo rosto a inveja era bem visível. A mim, um dia, na sua mais piedosa mentira, disse-me: "Meu filho, se eu sou "A Montanha", tu és "A Alta Montanha"... Daí o soneto que lhe dediquei aquando da homenagem que em 1998 a Academia Antero Nobre lhe prestou.

Porque fui, sem a menor dúvida, o mais antigo e próximo Amigo de Maria Helena, pelo menos em Portugal, serei quem melhor e mais fielmente estará em condições de falar sobre esta Genial Poetisa. E é uma dramática pena, porém, que a sua Obra não tenha a divulgação que merece e que é dada a tantos e tantos medíocres que se pavoneiam por aí, só porque têm acesso à Televisão e à Imprensa ou porque a Política os promoveu, tornando-os visíveis. E esta constatação aplica-se, também, a outras áreas da nossa infeliz (in)Cultura!

Maria Helena, essa, será sempre, ao contrário daqueles, uma Genial Poetisa e uma POETISA VERDADEIRAMENTE IMORTAL!

Aníbal Nobre
Porto de Mós-Portugal

(texto retirado do Volume I, páginas 53 e 54 da Antologia em 6 volumes, intitulada "Poetas Imortais", idealizada, coordenada e editada por Aníbal Nobre em Portugal no ano de 2015, sendo as páginas 55 a 68 compostas de poemas da poetisa Maria Helena). 





4 comentários:

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  3. Boa tarde. Gostaria de saber onde obteve o texto editado por Aníbal Nobre e se conhece alguma maneira de o contactar?

    Cumprimentos,
    Joana Abrantes.

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    1. Desculpe o atraso da resposta.
      O texto de Anibal Nobre foi retirado de uma Antologia editada por ele em 2015 com poetas portugueses e brasileiros. Estou tentando me contactar com ele, mas parece que está retirado. Cumprimentos de Regina Coeli.

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